segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Além da floresta, as pessoas: Centro de Memória da Amazônia




Por Uriel Pinho

                A região amazônica é frequentemente retratada na mídia como uma região rica, inexplorada e onde os conflitos sociais pelo uso dos recursos naturais são frequentes. A cultura, quando retratada, parece querer se restringir a cultura indígena, de maneira exótica e como que desvinculada dos modos de vida da maioria não indígena dos cerca de 25 milhões de habitantes da região.

É necessário entender a Amazônia em sua complexidade natural e econômica, e também do ponto de vista cultural e social das variadas populações que a compõem.

Em Belém, o Centro de Memória da Amazônia, órgão da UFPA, surgiu com o intuito de promover a pesquisa sobre aspectos pouco explorados do passado social e cultural principalmente da Amazônia brasileira, e ainda aproximar essa produção científica das redes de ensino fundamental e médio.

O Centro de Memória da Amazônia

                O processo de institucionalização de um polo cultural que reunisse memória, ensino e práticas artísticas teve início em 6 de fevereiro de 2007, período em que a UFPA firmou um acordo com o Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJE-PA),se responsabilizando pela guarda do “arquivo inativo” do TJE, ou seja, cerca de 35 toneladas de documentos diversos, de natureza cível (registros de casamento, nascimento, divórcio...) ou criminal (processos de roubo, homicídio, estupro...), compreendendo desde o ano de 1796 até 1970 que tinham baixíssima freqüência de uso e corriam o risco de se perder devido a falta de estrutura do TJE para mantê-los.

                Devido à importância histórica dos documentos, a UFPA iniciou a estruturação do prédio de sua antiga gráfica, no bairro do Reduto em Belém, para abrigar o arquivo. Sob a coordenação do professor Otaviano Vieira da Faculdade de História da UFPA, foi feita a organização de muitos documentos e mesmo com condições ainda não ideais, o Centro de Memória da Amazônia recebeu cerca de 600 visitas de pesquisadores do Brasil e de outros países, somente em 2009.

A reforma iniciada em outubro de 2009 inclui a climatização do espaço, construção de um auditório multiuso com cerca de 50 lugares. Além de salas para a administração e pesquisa, e da aquisição de 18 corredores de estantes móveis para as cerca de 3 mil caixas de arquivos.

 Segundo o professor Otaviano Vieira, apesar de cumprir importante papel acadêmico, o principal objetivo do CMA é justamente se firmar como mais um espaço cultural da cidade de Belém, atendendo à população como um todo, por meio de atividades lúdicas e educativas.

Ensino e Pesquisa

                Um dos campos de atuação do CMA diz respeito à construção da história da inquisição na Amazônia. Após parceria com o Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Portugal, foi examinado o acervo de cerca de 10 mil processos da inquisição portuguesa, e desses separados cerca de 100 referentes ao então Estado do Grão-Pará e Maranhão (atualmente, quase todo o norte do Brasil, mais o Maranhão e parte do Mato Grosso).

Este acervo agora está digitalizado e disponível no site do CMA. E não interessa apenas a acadêmicos, pois através da intolerância inquisitorial é possível revisitar a intolerância nos dias atuais – incluindo fenômenos como o bullying.

Sociedade: foco principal

                Ações como essa revelam a importância da história e da memória como instrumentos a favor do presente. Como dito pelo historiador Marc Bloch*, A história é uma ciência dos homens no tempo e não simplesmente uma ciência do passado. Por trás dos documentos deteriorados, artefatos antigos e peças em desuso, são os seres humanos que a história quer enxergar.  Esses objetos são peças do quebra-cabeça que nos conta sobre as pessoas, a maneira como elas viam o mundo e estavam inseridas nele.

                História pode ser análise e criticidade ao invés de simples narrativa. O que quer dizer não se limitar ao culto de um passado repleto de heróis e grandes feitos. Ao voltarmos nosso olhar para pessoas e acontecimentos até mesmo corriqueiros, há muito acabados, revisitamos o próprio presente.

Pois em grande medida, o passado é uma construção que obedece às demandas culturais, políticas e econômicas do presente. Não faltam exemplos de fatos do passado que foram invisibilizados ou trazidos de volta à tona de acordo com determinado contexto social. Nesse jogo de lembrar pelo qual nos conduzem os historiadores, muitas vozes que foram caladas ao longo do tempo, novamente são ouvidas.

  • BLOCH, Marc. Apologia da História: ou oficio de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zarah Editor, 2001

http://www.portal.ufpa.br/interna_minutodauniversidade.php

http://www.portal.ufpa.br/gerencia/exibeVideo.php?id=332

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