O documento do mês de janeiro corresponde a uma denúncia feita em 28 de julho de 1906 contra João Francisco da Silva natural da Sérvia e Carlo Menezes natural do Estado do Piauí, acusados de "exercício ilegal da medicina e prática de sortilégios". É importante entender que nesta época (final do século XIX e começo do século XX) qualquer prática medicinal que não fosse aquela regulamentada pelo Governo era considerada crime. Neste caso as testemunhas o acusam da prática de pajelança, visto com maus olhos por boa parte da população, que mesmo tendo esta prática como antiquada ou ultrapassada, ainda assim por diversas vezes recorriam a esta pratica caso a medicina legalizada não conseguisse "dar conta de todos os enfermos que surgiam".
Com isso pode-se perceber que a prática apesar de ser proibida e mal vista pela população ainda sim era requisitada, talvez por ainda ter "crédito" para com a população, o que pode caracterizar a forte presença da cultura popular na sociedade paraense nessa época, apesar da ciência estar tentando ter o monopólio do conhecimento, mesmo que para isso ela precisasse menosprezar certos conhecimentos que hoje sabemos serem muito valiosos. Uma das testemunhas de acusação nos mostra bem esse caso, o Sr. João Carvalho que devido ao enfermo de sua mulher Maria Joaquina da Conceição acaba recorrendo aos serviços do dito curandeiro João Francisco da Silva para que através de suas habilidades pudesse realizar o tratamento de sua mulher, contanto que João Carvalho pagasse a quantia de 100 mil réis. Sua mulher por sua vez se recusa a receber o tratamento dizendo que: "... não o respeitou, por ser João Francisco da Silva um individuo que se desse a prática de pajelança, em vista das boas noções que lhe dera Menezes...", com isto vemos de um lado a requisição (e confiança) por parte de uns na prática e do outro a total negação de indivíduos com relação a estas praticas consideradas não confiáveis. O processo inteiro passa por essa dualidade, onde o as testemunhas tentam justificar (por vezes tentando se inocentarem que qualquer tipo de acusação) sua escolha por essa pratica por se tratar de uma pessoa que sabia fazer as mais diversas curas, como lhes era defendido por Carlos Menezes, deixando a entender por varias vezes eles deixavam se levar pelo desespero e pela crença em uma boa "propaganda" feita por Carlos Menezes.
Documento proveniente do acervo criminal do Centro de Memória da Amazônia. 4ª Vara criminal – Exercício illegal da arte dentária e medicina. Sobre o tema ver: FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. A Cidade dos Encantados: pajelança, feitiçaria e religiões afro-brasileiras na Amazônia. EDUFPA. Belém, 2008.
* texto foi feito pelo bolsista Luiz André Cruz Moreira, acadêmico do curso de História – UFPA.
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