segunda-feira, 30 de maio de 2011

Documento do Mês de Maio

O mês de maio é marcado pelo dia das mães e pela abolição oficial da escravidão, e aproveitamos o ensejo para registrar um caso interessante que abrange esses dois universos. O documento em questão se trata de um processo de auto crime de infanticídio que se configura em matar recém-nascido, isto é infante, nos sete primeiros dias de seu nascimento quer empregando meios diretos e ativos quer recusando á vitima os cuidados necessários á manutenção da vida e a impedir a sua morte. No documento a escrava de nome Maria é acusada de matar seu filho recém-nascido e depois em "combinação" com Innocencio dos Reis teriam "interrado" a dita criança.

No dia 12 de fevereiro de 1877 na Inspetoria do 12º quarteirão do distrito de Abaeté, por intermédio do Capitão Antonio Constancio da Silva é oficializada a noticia do que até aquele momento o crime ainda era obscuro pois se tratava da ocultação de um cadáver, recém-nascido da escrava de D. Josepha, moradora no rio Piquiarana que segundo depoimentos no auto teve seu filho no mato após ser espancada por sua Dona e deu para o senhor Innocêncio dos Reis enterrar, pois horas depois ela percebeu que a criança já tinha falecido. 

Diz Maria de Nazareth que ela sofria recorrentes maus tratos infligidos pela sua senhora durante o período de gravidez da criança falecida e afirmou que ela procedeu desta forma "...por que não queria para si a filha da respondente por que já era liberta...". A atitude de Dona Josepha reflete o momento histórico da época (o documento data do ano de 1877) em que estava vigorando a Lei do Ventre Livre desde o inicio da década de 1870, que somavando-se as leis anteriores, que em termos práticos eram inócuas e apenas retardavam a abolição definitiva da escravidão. A Lei do Ventre Livre previa que os filhos de escravas nascidos no Brasil seriam livres. Mas, a título de indenização, os donos de escravos podiam contar com o trabalho dos "nascidos livres" até os 21 anos – ou receber títulos do governo quando a criança completasse 8 anos.
Antes desta que veio a falecer ela gerou outra criança e já sofria maus tratos pela sua dona, pois seu filho anterior nascera livre e longo foi entregue a sua madrinha. E no dia do possível crime já pela manhã apresentava as dores do parto quando foi servir o café para sua Dona, Dona Josepha percebendo seu estado lhe rogou o seguinte "... já te disse queres pary,se é assim, muda-te vai pary para o enferno pois não quero aturar filhos libertos." Isto motivou a escrava a fugir da sua Dona para ter seu filho na casa de seu senhor José Narciso porém, a criança nascei no mato mesmo. Ela então embrulhou a criança na sua saia e levou para casa da sua dona, colocando-a no girao deixando-a lá até a chegada de Innocêncio dos Reis, no qual ela pediu "... pedio-lhe pelo amor de Deos que fosse enterrar aquelle inocente..." já que Maria verificou horas depois que a criança tinha morrido. 

Na conclusão do delegado podemos verificar que a escrava teve uma filha do sexo femino e que em "... combinação com Innocencio dos Reis como consta nos Interrogatório feito a ambos..." enterrou a recém-nascida e que não se evidencia o infanticídio havendo apenas contra eles o fato de terem ocultado o fato, pois se verificou que a criança não foi enterrada viva. É interessante notar que pelas autoridades a escrava não só é isenta de culpa, como se sugere que a sua senhora é a única culpada na história como aponta o parecer final do delegado – que é inclusive apoiado pelo promotor público - sobre o caso: de acordo com os depoimentos das testemunhas se "... ividencia que da parte da proprietaria D. Josepha Trindade Dias aparece a dezomanizada única responsável pelo fato dado...". Infelizmente desconhecemos o trâmite final do processo, pois o ele foi arquivado. Confira a transcrição de partes interessantes do documento, como o depoimento da escrava ou a conclusão do delegado.

Sobre o tema ler: BEZERRA NETO, José Maia. O 13 de Maio, a abolição e as visões de liberdade. Reflexões e inquietações sobre o fim da escravidão no Brasil.. História e-História, v. 00, p. 29/06/2010, 2010. CHALHOUB, Sidney. Visões da Liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

Santos, Washington dos.
Dicionário Jurídico brasileiro/ Washington dos Santos – Belo horizonte: Del Rey. 2001. 
 

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